terça-feira, 19 de janeiro de 2010

A estória de sempre

- E aí você ocupa a sua mente com diversas obrigações. São elas as mais perversas angústias: os estudos, o trabalho, as contas, quer dizer, a porra das contas, e lógico, o amor. Parece que é obrigatório esse último tema, sem este você não é completo. Te obrigam a tê-lo, praticamente , como ordem do dia, sabe?

- Sei.

- Mas o problema está que você tem de resolvê-los não para si, mas para os outros. Veja, se eu não concluir meus estudos e fazer algo que muitos esperam, fracassei. Ou ainda, se socialmente eu não resolvo a mesma questão amorosa que acabo de falar, como eles me verão? "Eles", é claro, eu digo no sentido mais aberto possível, "todos" seria o mais correto.

- Isso que eu ia te falar...

- Não cara, mas aguarde um minuto, porque ainda existe o "eu". E o engraçado, ao mundo, parece que o "eu" não existe, e sim o "ele". Mas eu te pergunto, e eu? Eu fico atado ao "ele" e por vezes esqueço o "eu", por mais egoísta que eu ou você possa ser, entende?

- Entendo, mas penso que devam ser destinados momentos específicos para se resolver cada situação. Mesmo que essas estejam em meio a um turbilhão. Ou venham como um turbilhão.

- Esse é um grande problema. Parece que nos são vomitadas infinitas situações e, infelizmente, não é possível ser destinado um tempo a cada. A vida não é estática, como posso topicizá-la? Não posso, óbvio.
Assim sendo, eu fico refém dessas imposições mundanas, e quer saber, não resolvo porra nenhuma! Por que? Por que me abstenho? Por que não consigo organizá-las? Sei lá o porque...

- E quem sabe?

- Eu sei que sofro com essa confusão toda... Tem algo de muito errado nisso tudo, é a falta de racionalidade do mercado? A falta de planejamento social e imposição de um sistema, e lógico as suas nuances poderiam ser as maiores responsáveis, mas não convém adentrarmos aqui. E como consequência os ridículos valores ocidentais ? Como consequência mesmo, resultado final eu digo. É o que tendo a crer velho.
Porém, ainda assim, eu acredito que existam outras questões que perpassam essas minhas interogações e possíveis teses.

-Ah, o amor...

- Como sempre isso. E como sempre a história se repete. Não pode ser, deve existir algo de muito errado mesmo, ou somente parodiamos o passado? Que dúvida!
Não é possível não superarmos nossas limitações cara. Isso deve existir pelas mais diversas razões, mas eu arrisco dar um palpite que é pelo nosso egoísmo. Que por mais despreendido que sejamos, ainda nos sobram resquícios dos mais sujos, infectantes, que aparentemente não somos capazes de superá-los. E essa situação nos fragiliza de uma maneira, mas de uma maneira... Não sei, acho que a palavra é vulnerabilidade.
Mas infelizmente eu não sei te dizer o porquê disso...
É velho, é difícil pensar todas essas questões, mas assim eu sigo com meus devaneios e filosofia barata. Ao menos serve de atração circense aos olhos de terceiros.


* Trecho de um diálogo do meu próximo filme que não entrará em cartaz

5 comentários:

entreosdentes@gmail.com disse...

muito bom!

pena que o filme não entrará em cartaz, seria tão interessante...


e obrigada pelas palavras no meu blog, camarada...

beijo, beijo.. com saudade...

Patricia disse...

ÊNIO!

bom ler coisas suas! e ainda assim, bem escritas! =)

beijo beijo!!!

Alex Arcanjoleto disse...

Ficou realmente bom.Sem mais comentários.

Anônimo disse...

Num dialogo se pressupõe duas pessoas falando

A arte imita a vida ou a vida imita a arte ?

No segundo caso é preciso tomar cuidado para não se tornar pedande; e os dialogos se tornare monologos e estes, apenas interiores

Abraço

Enio Lourenço disse...

Travessão: pode ser empregado no discurso direto para indicar a fala da personagem ou a mudança de interlocutor nos diálogos.

Talvez, por falha, saíram como hífen e não como travessão. Independente, a forma pressupõe a compreensão necessária.

Obrigado por me lembrar, anônimo "pedande" (sic).