- E aí você ocupa a sua mente com diversas obrigações. São elas as mais perversas angústias: os estudos, o trabalho, as contas, quer dizer, a porra das contas, e lógico, o amor. Parece que é obrigatório esse último tema, sem este você não é completo. Te obrigam a tê-lo, praticamente , como ordem do dia, sabe?
- Sei.
- Mas o problema está que você tem de resolvê-los não para si, mas para os outros. Veja, se eu não concluir meus estudos e fazer algo que muitos esperam, fracassei. Ou ainda, se socialmente eu não resolvo a mesma questão amorosa que acabo de falar, como eles me verão? "Eles", é claro, eu digo no sentido mais aberto possível, "todos" seria o mais correto.
- Isso que eu ia te falar...
- Não cara, mas aguarde um minuto, porque ainda existe o "eu". E o engraçado, ao mundo, parece que o "eu" não existe, e sim o "ele". Mas eu te pergunto, e eu? Eu fico atado ao "ele" e por vezes esqueço o "eu", por mais egoísta que eu ou você possa ser, entende?
- Entendo, mas penso que devam ser destinados momentos específicos para se resolver cada situação. Mesmo que essas estejam em meio a um turbilhão. Ou venham como um turbilhão.
- Esse é um grande problema. Parece que nos são vomitadas infinitas situações e, infelizmente, não é possível ser destinado um tempo a cada. A vida não é estática, como posso topicizá-la? Não posso, óbvio.
Assim sendo, eu fico refém dessas imposições mundanas, e quer saber, não resolvo porra nenhuma! Por que? Por que me abstenho? Por que não consigo organizá-las? Sei lá o porque...
- E quem sabe?
- Eu sei que sofro com essa confusão toda... Tem algo de muito errado nisso tudo, é a falta de racionalidade do mercado? A falta de planejamento social e imposição de um sistema, e lógico as suas nuances poderiam ser as maiores responsáveis, mas não convém adentrarmos aqui. E como consequência os ridículos valores ocidentais ? Como consequência mesmo, resultado final eu digo. É o que tendo a crer velho.
Porém, ainda assim, eu acredito que existam outras questões que perpassam essas minhas interogações e possíveis teses.
-Ah, o amor...
- Como sempre isso. E como sempre a história se repete. Não pode ser, deve existir algo de muito errado mesmo, ou somente parodiamos o passado? Que dúvida!
Não é possível não superarmos nossas limitações cara. Isso deve existir pelas mais diversas razões, mas eu arrisco dar um palpite que é pelo nosso egoísmo. Que por mais despreendido que sejamos, ainda nos sobram resquícios dos mais sujos, infectantes, que aparentemente não somos capazes de superá-los. E essa situação nos fragiliza de uma maneira, mas de uma maneira... Não sei, acho que a palavra é vulnerabilidade.
Mas infelizmente eu não sei te dizer o porquê disso...
É velho, é difícil pensar todas essas questões, mas assim eu sigo com meus devaneios e filosofia barata. Ao menos serve de atração circense aos olhos de terceiros.
* Trecho de um diálogo do meu próximo filme que não entrará em cartaz